diumenge, 6 de gener del 2013

Leitura recomendada: Arno Vogel, Marco Mello, José Barros, "A galinha d'angola: iniciacao e identidade na cultura afro-brasileira" (FLACSO, 2012)


Leitura recomendada: Arno Vogel, Marco Mello, José Barros, A galinha d'angola: iniciacao e identidade na cultura afro-brasileira, FLACSO, Río de Janeiro, 2012, 229 p.

A pesquisa etnográfica que deu origem ao livro Galinha d'Angola: iniciação e identidade na cultura afro-brasileira, já em 2ª. reimpressão de sua 3ª. edição (RJ: Pallas, 2006), parte do princípio que a ida ao mercado que antecede a "feitura do santo" é, também ela, parte do processo de iniciação, configurando uma verdadeira lição-de-coisas para o noviço.

Diante das exigências primeiras sob a insígnia de Exu, o "senhor do mercado", os filhos-de-santo se inserem definitivamente em um sistema de obrigações e prestações, incorporando-se à estrutura hierárquica do terreiro, onde deverá realizar o bori, ou seja, a "feitura da cabeça", segundo os preceitos da vida piedosa de uma existência individualizada no candomblé, moldada pelos ritos iniciáticos.

O ritual do Orúko, ou dia-do-nome, revela a público a reprodução social do terreiro pela adesão de novos adeptos, que saem do recolhimento no runcó catulados, raspados, adoxados e com o corpo coberto de pintinhas brancas; metaforicamente renascidos, portanto, como galinhas-d'angola. Considerada um "bicho feito" na cosmologia do candomblé, a galinha-d'angola é o símbolo focal dos ritos de iniciação, elo de comunicação direta entre os homens e os deuses, ideal de plenitude da vida.

A obrigação final de ir à missa encerra o processo ritual de iniciação com uma espécie de desafio, que tem lugar no templo e no rito de outra confissão religiosa. A vindicação do sagrado sob a forma de um escândalo, marcado pela presença visível do povo-do-santo no espaço público da igreja católica, transforma-se em uma experiência definitivamente inscrita na memória dos novos iniciados. Afinal, por que o iaô tem de ir à missa?

No jogo entre a humildade e a arrogância dos iaôs em romaria, os limites identitários e o conflito deflagrado permitem uma interpretação que escapa das armadilhas espistemológicas do "sincretismo", insuficiente para explicar as transações e o engajamento conversacional estabelecido entre dois universos religiosos distintos e dialeticamente complementares no Brasil.

A Galinha d'Angola - iniciação e identidade na cultura afro-brasileira, dos professores Arno Vogel, Silva Mello e Pessoa de Barros, é um clássico no campo dos estudos afro-brasileiros, equiparado às obras de Bastide, Verger e Edson Carneiro, superando-as, no entanto, por não se restringir apenas a um alentado e rigoroso estudo acadêmico, mas por constituir-se em pesquisa militante, na qual os autores se deixaram envolver conscientemente pela riqueza, sofisticação e sutileza das práticas cerimoniais do candomblé, no qual tudo é sagrado, já que somos, simultaneamente, tudo e todos, quer animados quer inanimados, partículas dos orixás.

Essa postura inédita diante do universo a ser analisado resulta num desvendar dos elementos-chave para a compreensão do que popularmente se convencionou chamar de povo do santo. A galinha d'angola está presente nas mais importantes cerimônias do candomblé. Sem ela não existiria vida, já que representa o elemento primordial nos mitos de criação, o alimento de deuses e de homens, a oferenda propiciatória de axé e equilíbrio, enfim, o bicho "feito" tão à mostra que não se tinha dado a ela, até então, a devida importância.

[Extraído da web  ifcs.ufrj.br/~lemetro/mello.php]

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